sábado, novembro 26, 2011

Educar(-se) na Esperança…

Há quem espere e há quem desespere e, na voragem do tempo presente, damo-nos conta que continuamos a correr demasiado. À nossa volta os ritmos vão sendo alterados, até a natureza, ainda que palidamente, começa já a dizer-nos que os seus ciclos, bem definidos por séculos, parecem agora querer alterar-se. Se olharmos mais atentamente, vamos ver já as ruas cheias de gente que em tempo de crise(s) vê apelos por todos os lados (promoções para todos os gostos: -20%, -50%, -70%...) e um sem fim de enfeites, luzinhas e montras que nos dizem: “já é natal!”.

Estranhamente, iniciamos hoje o tempo do Advento [tempo de expectativa, de espera paciente, isto é, plena de esperança] quase que em “contra-corrente” ao que já vêem os nossos olhos e ao rumor que já chega aos nossos ouvidos. Alguns que gostam de “comentar na hora” a realidade vão dizer uma vez mais que a Igreja é “retrógrada e incapaz de acompanhar a evolução dos tempos” e, também alguns mais habituados a conformar-se com o que é dito no imediato, acharão estas vozes sedutoras porque se auto-convencem (uma vez mais!) de que a vida é feita de pressa, a correr…e que não há tempo a perder. Esses continuarão a correr…para chegar a lado nenhum!

Todas as vidas são feitas de espera, esperança e expectativa. Num tempo tão centrado nos ponteiros do relógio, que parecem cavalgar cada segundo a um ritmo capaz de superar o próprio tempo, importa sobretudo redescobrir como precisamos de esperar e de esperança! Todo o fruto maduro só pode ser colhido, para ser verdadeiramente saboreado, no tempo oportuno. A vida toda, só pode ser lida na sua profundidade e verdade, quando “degustada” em cada encontro, em cada pormenor. Com tempo e com ritmo, mas sem pressa! Também é assim ser cristão. É sê-lo com tempo e com ritmo, sem a pressa voraz de um relógio que nos diz que o tempo passa sem nós passarmos por ele.

Habitando uma história concreta, a nossa e a dos homens e mulheres nossos irmãos, olhamos para o presente como um dom, mas sabemos que não temos aqui “morada permanente” e, voltados para “Aquele que sempre nos espera”, assumimos como medida para o tempo não o ritmo do relógio (Χρόνος) mas a Esperança.

Uma Esperança que refaz a vida a partir de cada encontro, olhos nos olhos com cada pessoa, coração-a-coração. Uma Esperança que em cada manhã abre os meus olhos para o milagre da vida e me convida a ser construtor de um futuro melhor onde humildade e verdade, empenho e dedicação caminham de mãos dadas. Uma esperança que não se torna uma alienação ou utopia que me distancia dos outros e da realidade, mas uma esperança que vê e me diz, no concreto da vida, que é aqui que acontece o tempo da salvação (καιρός).

É por isso que a Esperança Cristã, celebrada uma vez mais em advento, não é descompromisso mas empenho; é desafio, recomeço, construção. Ter esperança (ou esperar) para um cristão nunca é um exercício de individualismo, é sempre uma realidade dialógica:

Esperamos em Cristo, com Ele, n’Ele. Esperamos com a Igreja, casa dos ressuscitados, tenda da Esperança, testemunha da Nova e Eterna Aliança. Esperamos no Mundo com todos aqueles que querem ver mais longe e mais profundamente, sobretudo com os que têm fome e sede de justiça e de verdade, de misericórdia e de paz, de Amor…Esperamos com todos os viandantes que, com fome e sede de Deus, deixam que seja Ele o primeiro a encontrá-los.Esperamos, Alegramo-nos e Fazemos caminho…porque Ele vem!

Para aprofundar a Esperança, em tempo de advento, aqui fica uma sugestão de leitura (clicar AQUI)


quarta-feira, novembro 09, 2011

Tudo é um milagre…quando aprendemos a ver!

Há dias em que a rotina (parece que) nos mata! Há outros dias em que andamos tão anestesiados que não vemos um palmo à frente do nariz, tudo corre (e decorre) diante da nossa apática vontade. E há outros em que o dom e os dons de Deus parecem tão vivos e presentes que acabamos por despertar e dar-nos conta que afinal eles sempre lá estiveram…nós é que não quisemos vê-los!

Vem isto a propósito de um “milagre do quotidiano”, como costumo chamar-lhe.

Por estes dias, no rebuliço da vida académica quotidiana, uma colega partilhava comigo a dificuldade que uma outra colega sua estava a ter para realizar um determinado trabalho para uma das disciplinas que está a frequentar este semestre. Contou-me que a viu chorar muito estes dias, pois é estrangeira e está aqui apenas há 2 meses, e as dificuldades com a língua ainda são grandes, e sublinhou que ela não estava a ser capaz de escrever uma linha para esse bendito trabalho, de tão bloqueada que estava com os nervos.

Em segredo esta colega decidiu, para a ajudar e estimular, fazer-lhe uma das páginas desse trabalho, segundo ela a parte mais difícil, pois envolvia a análise de um estudo sociológico italiano e a consequente elaboração de um gráfico com dados estatísticos… e lá meteu mãos à obra! Pediu a minha ajuda e, durante a hora de almoço, lá trabalhámos. Depois do trabalho feito fomos participar num simpósio organizado pela nossa Universidade sobre “a Missão em tempos de Nova Evangelização”.

Terminado o simpósio, Roma brindava-nos com um inicio de noite muito chuvoso, tínhamos de apanhar o autocarro e lá saímos apressados do auditório; Enquanto saíamos ela agradecia imenso a ajuda, com os olhos a brilhar de lágrimas, pois tinha a certeza de que quando chegasse a casa a colega, que não sabia desta sua iniciativa, iria sentir-se bem e iria animar-se.

Enquanto passávamos apressados diante da capela da universidade ela puxa-me pelo braço e diz-me: “anda daí que eu não posso ir embora sem te agradecer a ajuda”. Eu lá lhe disse que não precisava de me agradecer, etc. e lá acabámos por entrar na capela da universidade.

Ajoelhámo-nos e ela começou a prostrar-se e a beijar o chão. Fazia-o com uma delicadeza tal que me impressionou. Ficámos ali alguns instantes em silêncio, e quando saímos disse-me: “é assim que se agradece a alguém na minha cultura! E como eu sei que o fizeste por Deus não podíamos ir embora sem eu Lhe agradecer a ajuda que ele me deu por ti. Obrigado!”. Dei-lhe um abraço e lá fomos apanhar o autocarro.

Diante de mais este “milagre do quotidiano” dei por mim em silêncio, por entre a chuva e um autocarro cheio de gente, a recordar-me do dia da minha ordenação sacerdotal, também eu prostrado por terra a escutar a ladainha dos santos…e a dizer-Lhe: “Obrigado, eis-me aqui!” Cheguei a casa, ainda em silêncio, era o fim de mais um dia, mas com uma certeza renovada: Tudo é um milagre…quando aprendemos a ver!

www.youtube.com/watch?v=zUed26NaIz0