segunda-feira, março 21, 2016

EM TUAS MÃOS ENTREGO...

Não há solidão maior do que a de não se sentir amado! É que nenhum de nós foi criado para a solidão, no sonho de Deus todos somos comunhão. Para a noite tem o dia, para enxugar as lágrimas a esperança, para acariciar a dor a ternura, para rasgar horizontes novos ao passado tem o futuro, basta estar atento para percebermos no ‘milagre da vida’ a dança eterna desta comunhão com o Deus-Amor.  

É para romper a solidão, e nos abrir ao amor (e)terno, que o Evangelho nos comunga nesta semana e nos faz entrar na intimidade mais intima do nosso Deus. Chegou a hora! O Profeta de Nazaré que não se calou diante da injustiça, que levantou do chão os que mendigavam perdão, que nos mostrou que a vida é caminho de bem-aventurança, que nos fez ver Seu Reino já presente no meio de nós, que nos revelou que a única palavra definitiva é somente aquele Amor que nos permite degustar interiormente todas as coisas, senta-se agora para repartir fraternalmente o pão da Sua existência e assim nos permitir ser comunhão, fazer comunhão.

Iniciámos uma Semana chamada de ‘Santa’, de ‘Semana Maior’ e na Liturgia do Rito Ambrosiano (de Milão) ela é também chamada de ‘Semana Autêntica’. O que somos chamados a viver não é um ‘filme’ ou mera ‘recordação’. Nós somos parte desta história. Somos esta história de Salvação! História cheia de recomeços e de futuro, uma história de Amor, Conversão, Reconciliação. Nesta história não somos nem estrangeiros, nem hóspedes. Somos Filhos! Gerados pela misericórdia, aos olhos humanos absurda, de um Deus que se enamorou da nossa pequenez. Um Deus excesso de Amor que nos revela que não há omnipotência maior do que aquela de dar a vida, de ser vida.

Aqui não há papéis principais nem secundários, não há ‘Óscar’ para premiar carreiras, não há passadeiras vermelhas para desfilar opulência e banalidades. Esta é uma história cheia de Vida, de afeto, de ternura, de misericórdia. História de uma vida cheia de silêncio, de encontro, de lágrimas que regam a nossa infertilidade e aridez para semear nela o que só a Eternidade pode oferecer. E se hoje, aqui e agora, somos ‘vencedores’ é somente porque nos deixámos seduzir e vencer pela força sempre atrativa e irradiante do amor-perdão que Deus é, e que só Ele nos pode dar. Só o Amor-(e)terno pode sussurrar: “Hoje estarás comigo no Paraíso!”. Só a Misericórdia pode rasgar portas de eternidade onde o tempo teimar em ser só passado...

Desperta-nos o Evangelho para sermos peregrinos seguindo aquele que é o Caminho; desperta-nos o Amor para seguirmos Aquele que é a vida; desperta-nos a Misericórdia para seguirmos o único que é a Verdade. E, no fim, como peregrinos que percorrem de pés descalços o caminho que nos leva do ‘santuário do quotidiano’ ao coração de Deus, há-de ser nosso também o cântico de confiança entoado pelo Mestre: “Pai, em Tuas mãos entrego o meu espírito”. BOA SEMANA!



segunda-feira, março 07, 2016

DÁ-ME UM ABRAÇO...

Somos todos carentes de amor! No mundo dos afetos há palavras que nos curam, olhares que nos abrem ao infinito, abraços que nos levantam e reconstroem. Tal como na música, também aqui o silêncio não é ‘ausência’, mas sim o espaço que medeia o encontro entre o coração e a inteligência, entre o discernimento e a ação, entre o pensamento e a palavra. É bom lembrar ainda que na vida de todos os dias há muitas ‘sinfonias’ escritas com um silêncio contemplativo e adorador...são aqueles momentos em que o céu nos visita num encontro, num aperto de mão, num abraço que nos ‘desbloqueou’ o coração e a vida.

É também nesta sintonia e sinfonia de afeto que nos cruzamos com a sublime página do Evangelho de Lucas (Lc 15, 1-32) onde um Pai pródigo de Amor e misericórdia espera sempre o regresso do seu filho ‘mendigo’ de afeto e de reconciliação. É uma metáfora da nossa vida interior! Afastar-se do coração do Pai é desfigurar a nossa identidade. Já não nos sentimos filhos, apenas ‘mendigos’ de pão para a boca...quando o que nos falta afinal é afeto que cure e perdão que ofereça recomeço. Por entre idas e vindas, facilmente esquecemos que autonomia não é anarquia e liberdade não significa agir sem pensar ou decidir sem rezar.

O Pai não nos quer famintos, mas saciados; não nos quer dobrados sobre o peso dos nossos erros ou pecados, mas peregrinos curados pela ternura da sua infinita misericórdia; jamais nos olha de cima para baixo e sempre nos convida a levantar para o alto e para longe os nossos olhos e os nossos corações. É que Deus não nos sonhou pequenos, mas eternos! Na mesa da vida há sempre um prato que nos espera, há um Pai-inquieto que nunca deixa de acreditar no nosso regresso, um pai que não dorme e corre para a porta de cada vez que houve o rumor de passos...esperando que seja aquela ‘a hora derradeira’ em que vai poder abraçar de dignidade e perdão o ‘mendigo’ que não se acha mais filho.

A caminho da Páscoa, e quando a natureza se veste já com os primeiros perfumes da primavera, é bom não esquecermos que “quando a Igreja escuta, cura, reconcilia, torna-se no que ela é, no que ela tem de mais luminoso: uma comunhão de amor, de compaixão, de consolação; o límpido reflexo de Cristo Ressuscitado. Nunca distante, nunca na defensiva, livre de severidades, ela pode irradiar a confiança humilde da fé nos corações humanos” (Ir. Roger de Taizé).

E é assim, por entre a memória e o afeto, por entre exigência e ternura, que vamos ‘degustando’ cada recomeço, oferecendo e recebendo Páscoa de cada vez que ousamos dizer: “DÁ-ME UM ABRAÇO...”. BOA SEMANA! ;)