terça-feira, janeiro 31, 2017

“ALEGRIA SEM RESSACA”...


De quanta alegria é feito o nosso caminho quotidiano? Quanta alegria oferecem as nossas palavras e o nosso olhar? Vivemos num tempo marcado por uma ‘cultura da insegurança’ que gera em muitos uma estranha nostalgia do passado. Os profetas da desgraça, que sempre se apresentam nestas circunstâncias, parecem querer roubar-nos a alegria sincera ao ‘demonizarem’ o mundo contemporâneo...incapazes de dialogarem, refugiam-se numa vida blindada pelo veneno da amargura de quem não sabe ver o bom, o bem e o belo; Incapazes de contemplar o milagre da presença e ação de Deus nos outros, tornam-se pregadores de uma solidão egoísta; Incapazes de se inclinarem para cuidar da fragilidade humana, tornam-se ‘fiscais’ com uma moral rígida cheia de absolutos e pouco aberta ao dinamismo da graça e do discernimento; incapazes de se deixar interrogar pelo dom, tornam-se idolatras de um deus criado à sua imagem e semelhança, a quem servem mais por medo do que por amor.

É bom não esquecermos que a alegria não se improvisa! A alegria cristã é fruto do encontro, um encontro Pascal que muda a vida com a radicalidade da simplicidade, do serviço e da fraternidade. Não é alienação, é compromisso!

Vem tudo isto a propósito do Evangelho que nos acompanha esta semana (Mt 5, 1-12). Em que consiste afinal a felicidade? O Evangelho faz-nos ver que é feliz aquele que abre o coração a Deus, aquele que se deixa ‘desnudar’ dos ‘absolutos que nos desfiguram’ e aceita caminhar na lógica da vulnerabilidade.

Para vencer a lógica do egoísmo somos chamados à pobreza; para vencer a indiferença o evangelho nos convoca para a compaixão; diante da agressividade o Evangelho nos interpela a viver o discernimento; diante das injustiças o Evangelho nos estimula à lógica da profecia e do compromisso; Se no caminho houver erros, falhas ou pecados o Evangelho coloca-nos diante da lógica do dom; diante da ‘mundanização’ e do desiquilíbrio o Evangelho nos chama a viver por inteiro no coração de Cristo; por fim, diante de todas as guerras (por dentro ou por fora) o Evangelho nos interpela a assumir a não violência como medida de sabedoria para fazer pontes e reconstruir o diálogo. Não se trata de uma lógica ‘perversa’ ou simplesmente ‘do avesso’, trata-se de um caminho espiritual que nasce do encontro com Cristo-Vivo e só se torna efetivo quando em nossos corações reinarem os mesmo sentimentos que habitam o d’Ele.


A alegria cristã não é ‘piegas’, muito menos ‘romântica’ como se fosse uma ‘cena perfeita’ de filme com final ao ‘estilo americano’, em tarde de domingo chuvoso com lareira acesa, manta e chocolate...A alegria cristã nasce do encontro e se fortalece e redescobre no discipulado! Ela tem essa capacidade paradoxal de se deixar experimentar, e de se fazer presente, mesmo no meio do mais árido dos desertos. É por isso que a alegria cristã nunca é alienação, nem dá ressaca! Ela é dinamismo e opção, é decisão e compromisso, é seguimento! E se ela estiver no início de tudo, não precisaremos de ‘esperar o fim’ para a saborear...ela nos dará o sabor e o saber em cada passo e fará do milagre da nossa existência uma ‘alegria completa’...quotidianamente! Boa Semana!


segunda-feira, janeiro 16, 2017

...NÃO É SÓ UMA QUESTÃO DE ÁGUA!


Zygmunt Bauman escreveu que “a vida é muito maior que a soma dos seus momentos”. O dom que nos é dado para viver não se resume à ‘contabilidade’ superficial dos bons ou maus acontecimentos, vai além! Em cada encontro, em cada lugar onde estamos, nas pessoas com quem nos cruzamos, nos caminhos que percorremos, há uma centelha divina que nos acompanha, ilumina e desafia.

Vem isto a propósito da Palavra com que Deus nos visita esta semana (Jo 1, 29-34). Jesus faz-se caminho e vem ao nosso encontro nas circunstâncias em que nos encontramos. Deus sempre gosta de nos visitar nos locais que habitamos! O ‘extraordinário’ de Deus acontece no nosso cotidiano, habitualmente na dinâmica de um encontro que suscita intimidade e seguimento. Tal como João, também nós precisamos estar atentos a Cristo que passa e aprender a decifrar os ‘sinais’ da Sua presença.

Sabemos que a predileção de Deus é começar sempre ‘pelas margens’, foi assim naquele encontro no rio Jordão, é também assim com cada um de nós. Onde houver necessidade de presença, cura, esperança e libertação, aí está Deus a fazer-se próximo, a transformar a partir de dentro, a atrair para caminhar juntos! Somente Ele sabe o que somos e o que precisamos, por isso não hesita um instante em se fazer consolação, misericórdia, ternura e salvação.

Jesus gosta de estreitar as margens, de fazer pontes, de iniciar o diálogo, de oferecer perdão, de abrir horizontes. Como Deus-Peregrino, Jesus oferece comunhão para vencermos a solidão e a indiferença, unge as nossas feridas e transforma os nossos corações para que possamos ser vasos de esperança para a humanidade, chama-nos para o seguirmos pois sabe que, mais do que nunca, o mundo precisa hoje de rostos e de ternura para (re)aprender a olhar para além da ‘soma dos momentos’ e a degustar com sabedoria e discernimento o eterno e o instante.

Contemplar, Acolher, Escutar, Seguir e Imitar Jesus, eis os verbos essências para uma ‘gramática cotidiana’ do nosso discipulado. Como tenho conjugado estes verbos? Qual o peso que eles têm na minha vida?

Só podemos ‘ver’ o que João viu quando estes verbos deixarem de ser apenas ‘infinitivos impessoais’ e se tornarem uma ‘conjugação pessoal’ de verbos transitivos que unem o cotidiano com o Mistério da Fé. Aí sim, veremos o ‘Cordeiro’, nos sentaremos em Sua mesa e saborearemos com Ele o Pão que dá vida e coragem, o Pão que nos transforma em ‘Luz para as nações’. Nessa hora, nossos olhos se abrirão para ver ‘mais além’ e ‘para o alto’ e o nosso batismo não terá sido somente ‘uma questão de água’, mas sim o motor decisivo de uma vida ritmada pelo ‘Fogo-Amor Eterno de Deus’ que permanece em nós e nos faz Ver-Seguir e Dizer: “Eu vi e dou testemunho de que Ele é o Filho de Deus”. BOA SEMANA!



Um bom desafio para esta semana pode ser a (re)leitura do nº 262-283 da Exortação Evangelii Gaudium do Papa Francisco procurando refletir sobre como andas a conjugar os verbos essenciais da ‘gramática do seguimento de Jesus’. Pode encontrar o texto do Papa clicando Aqui