sábado, novembro 02, 2019

TU, QUE EU AMO, NÃO MORRERÁS! (Sobre a morte...e o sentido da vida)


Cara irmã morte, decidi escrever-te uma carta. 

Trago-te ‘colada’ a mim desde o dia em que nasci. Sei que no dia em que decidires vir ao meu encontro, para que eu faça a minha ‘última viagem’, há sonhos que vão ficar por realizar, palavras que vão ficar por dizer, abraços que vão ficar por dar…há também memórias que levarei comigo, rostos que jamais esquecerei! Será uma viagem feita de recordações, cheia de partilhas, com muita gratidão nos lábios e no coração. Nesse dia não me roubarás nada, apenas me convidarás a ‘ir mais adiante’ no caminho que desde sempre estava preparado para mim.

Queria pedir-te, no entanto, que quando ‘me abraçares’ tragas contigo, para derramar no coração daqueles que ficam, o ‘perfume da eternidade’. Não te peço que os impeças de chorar, pois sei que cada lágrima na hora da partida é um pequeno diamante que o amor foi lapidando ao longo da vida. Também não te peço que os iludas ou ‘anestesies’ tentando convencê-los que não é dor aquilo que sentem. Deixa que eles me sintam a desprender-me dos seus braços, faz que sintam ainda, por uma última vez, a doçura das minhas carícias e o calor do meu respirar. Deixa que me olhem nos olhos para me dizer: “a-Deus!” e assim me possam confiar (e confiar-se também eles!) Àquele que me sonhou, amou, fez viver e que agora me espera para entrar, do outro lado da porta da Vida, naquela comunhão de Amor que vai para além da paz e do silêncio do cemitério.

Nesse dia, em que o silêncio será teu companheiro de viagem, não te peço flores de alto preço, nem longos discursos, muito menos te peço que se escondam as lágrimas com óculos de sol. Não te peço, por fim, que me canonizem ou, no outro extremo, que me amaldiçoem. Peço-te apenas que dês àqueles a quem eventualmente magoei um pedido sincero de perdão e a certeza de que, abraçado pela infinita misericórdia de Deus, no céu serei seu intercessor; Se ainda puderes, e quiseres, deixa naqueles a quem mais amo, tatuada a certeza de que estarão sempre comigo. E, naqueles para quem tu és olhada como uma ‘irmã severa’, peço-te que faças germinar no seu íntimo a certeza serena da Esperança eterna, que agora se faz porta para que eu possa entrar no coração da Vida!

Cara irmã morte, peço-te apenas que, como no comum dos dias, esse ‘último abraço’ e esse “a-Deus” sejam marcados pela simplicidade e pela gratidão de um coração que cantou e viveu a alegria em cada passo. Que se cantem ‘aleluias serenos’. Sobre o caixão apenas ‘grãos de trigo’. Nos lábios palavras de ternura colhidas na Palavra. No coração, não o vazio mas a Vida. E quando a terra me entregar ao céu entoe-se um ‘magnificat’ cheio de Páscoa!

E agora, minha querida irmã, antes de terminar esta carta, e sabendo que todos os dias nos visitas, a nós que somos aqui peregrinos, deixa que desta vez seja eu que te abrace, te ‘surpreenda’ e te faça ‘degustar’ com a serena certeza que Aquele que me ama tatuou para sempre no meu coração:

«Eu sei que o meu Redentor está vivo e no último dia Se levantará sobre a terra. Revestido da minha pele, estarei de pé; na minha carne verei a Deus. Eu próprio O verei, meus olhos O hão-de contemplar» (Jó 19).

Minha querida irmã morte, vamo-nos cruzando, por aí, na ‘dança da vida’. Sabes, não te temo, e, no dia em que vieres, faremos juntos uma festa com a certeza de que em Cristo “nascemos e jamais morreremos” (Chiara Corbella).



sexta-feira, novembro 01, 2019

Com os pés no chão!...


A santidade não se improvisa. Também não é abstração. É a vida. Nua e cotidiana. Sem maquiagem. O Santo não é alguém desconectado, assexuado ou que vive numa bolha com medo de se ‘contaminar’. Os santos (Todos os Santos!) tiveram paixão, ternura, ousadia... profecia! São santos porque amaram!

Os santos trazem em si o perfume da Páscoa e, por onde passam, não somente tocam o chão da vida, mas também desnudam nossas almas e nos fazem ver para além da banalidade...Ensinam-nos a habitar a eternidade com um coração samaritano e, muito para além da cor pálida do rosto com que os fomos pintando e colocando em nossos altares, nos ensinam que (só) se chega ao céu com os pés na terra!

Como seria, talvez ainda mais provocador, se ao invés de colocarmos em nossas igrejas os santos em altares os colocássemos por terra, do nosso lado, com os pés no chão, para nos (re)lembrar e provocar a fazer de cada caminho cotidiano uma peregrinação onde cada passo nos leve a desejar, ainda mais, ser santo, ser céu...já...aqui...Hoje!

Por onde começa a santidade? Pelo encontro! Deixa que Ele possa ‘dançar’ e sussurrar no ‘santuário da tua consciência’ e na ‘tenda do teu coração’ aquela Palavra que te trará a paz interior que tantos buscas e aquela luz te fará ver, a partir de hoje, o invisível. Ele já anda por aí...pressentes os seus passos?





Diz(-nos) o Papa Francisco:

“Deixa que a graça do teu Batismo frutifique num caminho de santidade. Deixa que tudo esteja aberto a Deus e, para isso, opta por Ele, escolhe Deus sem cessar. Não desanimes, porque tens a força do Espírito Santo para tornar possível a santidade e, no fundo, esta é o fruto do Espírito Santo na tua vida. Quando sentires a tentação de te enredares na tua fragilidade, levanta os olhos para o Crucificado e diz-Lhe: «Senhor, sou um miserável! Mas Tu podes realizar o milagre de me tornar um pouco melhor». (...) Não tenhas medo da santidade. Não te tirará forças, nem vida nem alegria. Muito pelo contrário, porque chegarás a ser o que o Pai pensou quando te criou e serás fiel ao teu próprio ser. Depender d’Ele liberta-nos das escravidões e leva-nos a reconhecer a nossa dignidade. (...) Não tenhas medo de apontar para mais alto, de te deixares amar e libertar por Deus. Não tenhas medo de te deixares guiar pelo Espírito Santo. A santidade não te torna menos humano, porque é o encontro da tua fragilidade com a força da graça. No fundo, como dizia León Bloy, na vida «existe apenas uma tristeza: a de não ser santo»”.