É
curioso como, tantas vezes, nos acomodamos e vivemos a vida pela metade. Já
Ricardo Reis escrevia nas suas ‘Odes’: «para ser grande,
sê inteiro: nada Teu exagera ou exclui. Sê todo em cada coisa. Põe quanto és no
mínimo que fazes. Assim em cada lago a lua toda brilha, porque alta vive».
É esta ‘inteireza’ que a Palavra de Deus coloca diante do nosso coração e da nossa
inteligência esta semana. Pedro e Paulo. Discípulos. Apóstolos. Missionários. Sem
‘negociar’ o que lhes era mais conveniente, mas deixando-se sempre conduzir por
uma ‘loucura de amor’ chamada Evangelho, por uma paixão chamada ‘Reino de Deus’,
por uma vida: Jesus Cristo.
Sim,
é o encontro com Jesus que lhes muda a vida e os caminhos. De pescador rude da Galileia, de ‘traidor’ na hora da verdade, Pedro torna-se no ‘homem redimido
pela misericórdia’. Sim a ‘memória de Deus’ chama-se misericórdia e oferece
recomeço a quem tem a coragem de se ‘por em causa’. Só pode ser discípulo quem
não tem medo de se deixar abraçar na sua fragilidade, pois quem vive de 'auto-suficiência'
não tem lugar para a Vida. E é de Vida que devem ser habitados os nossos
gestos, palavras e opções fundamentais.
Peregrino
e discípulo, o pobre pescador da Galileia, descobre no caminho a sua
identidade: ser pedra, fundamento, alicerce de uma Igreja da qual tem as chaves
e à qual deve ‘abrir portas’ para que o Filho de Deus vivo seja mais conhecido
e mais amado (Mt 16, 13-19). Sim, as ‘chaves de Pedro’ não são para ‘enquistar’
o Evangelho fazendo dele ‘uma moral sem vida’, muito menos são chaves para
fazer da Igreja ‘uma casa fechada e cheia de perfeitinhos’ que não querem ser ‘contaminados’
por tocarem uma humanidade suja, ferida, desorientada. As chaves de Pedro são
para ‘destrancar’ os corações fechados, os horizontes curtos, as vidas
agrilhoadas.
Eis,
portanto, a graça maior de ‘estar com Pedro’, de ser ‘fiel a Pedro’ de ser a
Igreja de Cristo guiada por Pedro. Quem está com Pedro não é 'auto-referencial', nem
deseja viver numa Igreja de ‘medidas curtas’. Quem está com Pedro tem
horizontes largos, coração aberto, um olhar ‘contempl-ativo’, gestos cheios de
futuro. Porque quem está com Pedro tem o céu como medida e o Reino como projeto.
Quem está com Pedro vive uma graça que não se pode compreender ‘de fora’, a
graça da comunhão. É a graça de ser corpo. Corpo de Cristo na história da
humanidade. E isto não se improvisa, nem se teoriza. Vive-se!
Foi
também no caminho que Paulo, o perseguidor, se encontra com ‘o Vivente’, que lhe
enche de luz um caminho de escuridão que já há muito percorria. Com o
entusiasmo dos profetas, com a simplicidade de uma criança que se deixa
conduzir pelo Pai, com a docilidade de quem se sabe discípulo, este ‘homem novo’
faz do caminho uma metáfora para a vida e, a partir daquele dia, nenhum caminho
será longo!
Se
Pedro tem como missão ‘destrancar portas’ Paulo tem como missão ‘dilatar
corações’. Testemunha de uma Palavra que converte e salva, ele anuncia,
denuncia, questiona, propõe. É que ser cristão é uma ‘atração de amor’, e Paulo
sabe-o bem quando nos revela um segredo: ‘nem a morte, nem a vida,…nada nos
pode separar do amor de Deus manifestado em Cristo (Rom 8, 31-39).
Eu
e tu também estamos a caminho. Estamos no caminho da Vida. Trazemos dentro
perguntas que há muito nos interpelam. Não será menos interpelador se, em algum
dia desta semana, nas tuas encruzilhadas quotidianas, te deixares questionar
pelo Mestre: «E tu, quem dizes que Eu sou?». À pergunta do Mestre, Pedro e
Paulo não se calaram, e Tu?...
Esta semana convido-te a rezares pelo Papa, pelo nosso Bispo e pelo teu pároco.
Talvez eles não sejam ‘o que tu esperas deles’. Talvez até nem sejam ‘o que
Deus esperaria deles’…mas com a tua oração poderão, certamente, ser ‘melhores’.
BOA SEMANA!