Trago-te ‘colada’ a mim desde o dia em que nasci. Sei
que no dia em que decidires vir ao meu encontro, para que eu faça a minha ‘última
viagem’, há sonhos que vão ficar por realizar, palavras que vão ficar por
dizer, abraços que vão ficar por dar…há também memórias que levarei comigo,
rostos que jamais esquecerei! Será uma viagem feita de recordações, cheia de
partilhas, com muita gratidão nos lábios e no coração. Nesse dia não me roubarás
nada, apenas me convidarás a ‘ir mais adiante’ no caminho que desde sempre
estava preparado para mim.
Queria pedir-te, no entanto, que quando ‘me abraçares’
tragas contigo, para derramar no coração daqueles que ficam, o ‘perfume da
eternidade’. Não te peço que os impeças de chorar, pois sei que cada lágrima na
hora da partida é um pequeno diamante que o amor foi lapidando ao longo da
vida. Também não te peço que os iludas ou ‘anestesies’ tentando convencê-los
que não é dor aquilo que sentem. Deixa que eles sintam eu a desprender-me dos
seus braços, faz que sintam ainda, por uma última vez, a doçura das minhas
carícias e o calor do meu respirar. Deixa que me olhem nos olhos para me dizer:
“a-Deus!” e assim me possam confiar (e confiar-se também eles!) Àquele que me sonhou,
amou, fez viver e que agora me espera para entrar, do outro lado da porta da
Vida, naquela comunhão de Amor que vai para além da paz e do silêncio do
cemitério.
Nesse dia, em que o silêncio será teu companheiro
de viagem, não te peço flores de alto preço nem longos discursos, muito menos
te peço que se escondam as lágrimas com óculos de sol. Não te peço, por fim, que
me canonizem ou, no outro extremo, que me amaldiçoem. Peço-te apenas que dês
àqueles a quem eventualmente magoei um pedido sincero de perdão e a certeza de
que, abraçado pela infinita misericórdia de Deus, no céu serei seu intercessor;
Se ainda puderes, e quiseres, deixa naqueles a quem mais amo, tatuada a certeza
de que estarão sempre comigo. E, naqueles para quem tu és olhada como uma ‘irmã
severa’, peço-te que faças germinar no seu íntimo a certeza serena que nasce daquela
Esperança eterna, que agora se faz porta para que eu possa entrar no coração da
Vida!
Cara irmã morte, peço-te apenas que, como no comum
dos dias, esse ‘último abraço’ e esse “a-Deus” sejam marcados pela simplicidade
e pela gratidão de um coração que cantou e viveu a alegria em cada passo. Que
se cantem ‘aleluias serenos’. Sobre o caixão apenas ‘grãos de trigo’. Nos lábios
palavras de ternura colhidas na Palavra. No coração, não o vazio mas a Vida. E quando
a terra me entregar ao céu entoe-se um ‘magnificat’ cheio de Páscoa!
E agora, minha querida irmã, antes de terminar esta
carta, e sabendo que todos os dias nos visitas, a nós que somos aqui
peregrinos, deixa que desta vez seja eu que te abrace, te ‘surpreenda’ e te
faça ‘degustar’ com a serena certeza que Aquele que me ama tatuou para sempre
no meu coração:
«Eu sei que o meu Redentor está vivo e no último dia
Se levantará sobre a terra. Revestido da minha pele, estarei de pé; na minha
carne verei a Deus. Eu próprio O verei, meus olhos O hão-de contemplar» (Job 19).
Minha querida irmã morte, vamo-nos cruzando, por
aí, na ‘dança da vida’. Sabes não te temo, e, no dia em que vieres, faremos
juntos uma festa com a certeza de que em Cristo “nascemos e não morreremos
jamais” (Chiara Corbella).
BOM DOMINGO para ti que crês na Vida para abraçar a
morte!
Sem comentários:
Enviar um comentário