domingo, outubro 06, 2013

SERVIR(-se)!?...



«Era uma vez…uma ilha, pequena, a norte do continente africano. 
Um lugar muito belo, apreciado pelos turistas. 
Tem 5 mil habitantes, são muito simpáticos e afáveis. 
Tem uma área de 20,2 km². 
Um mar calmo, de águas quentes, e um suave perfume. 
É bonita, não achas?...»



Interrompo esta bela história para te dizer que estou aqui, sentado diante do computador. É Domingo. Já celebrei Eucaristia. Fui ouvir o Papa no ‘Angelus’ na praça de S. Pedro…Escutei bem o ‘peso’ de afecto, ternura e sofrimento que tinham esta palavras: «Gostaria de recordar com vocês as PESSOAS que perderam suas vidas em Lampedusa, na quinta-feira passada. Vamos todos rezar em silêncio por estes NOSSOS IRMÃOS E IRMÃS: mulheres, homens, crianças...DEIXEMOS CHORAR NOSSOS CORAÇÕES. Rezemos em silêncio».



Dei por mim, quase sem querer, a perguntar como Habacuc na primeira leitura da Eucaristia de hoje: “Até quando, Senhor, pedirei socorro, sem que me escutes? Até quando clamarei: «Violência!», sem que me salves? Porque me fazes ver a iniquidade e contemplar a desgraça?”



No ‘grito’ deste homem de Deus está também o grito de tantos e tantas que nestes dias viraram ‘vítimas’ e ‘número’ (hoje já vai em 211!). Fala-se hoje de Lampedusa (sim, é esse o nome daquela ilha) de modo leviano! Alguns ‘servem-se’ para ter audiência…para outros ‘serve’ como pedra de arremesso para uma qualquer oposição tão partidarista quanto oportunista.



De pergunta-em-pergunta dou-me conta novamente do que disse (e de como disse!) o Papa. Não se serve das PESSOAS QUE MORRERAM para ter um ‘share de audiência’…também não faz delas uma arma ‘sindicalista’ para uma qualquer exigência…e, ao contrário de mim, pobre pecador, também não faz perguntas a Deus…antes, coloca-os no coração de Deus pois sabe que são seus (e nossos!) irmãos e irmãs…e pede que deixemos “chorar o coração”…



Sabe o valor de uma lágrima quem tem memória, sabe o que é o dom da fé quem não foge da história, da realidade, e sabe quem é Deus aquele que descobriu a todos como irmãos.



Para viver na Fé, e com Fé, este jeito de ser “servo inútil a tempo pleno”, como diria D. Tonino Bello, é preciso pedir a Deus que nos liberte da autossuficiência que dispensa os outros e o Outro, pedindo-lhe também que nos dê a coragem de repetir em cada respiro: «aumenta a nossa [pequena] fé»…



Se acreditamos com o coração, professamos a fé com os olhos abertos! E não podemos ignorar ou contornar a realidade. Mas, já viste como é tão acomodado o nosso (o meu) ser cristão? Queres um exemplo? Faço-o em modo de pergunta: «Como é que reages quando algum mendigo na rua vem pedir-te algo?»…Aí tens a resposta! Não basta só dar-lhe uma moeda ou ignorá-lo. É ali que a “Lampedusa quotidiana” ganha (mais um) outro rosto e coração em agonia…é ali que ‘desembarca’ na nossa vida, diante de nós, na praia da nossa existência (a ‘1 km do areal’- como dizem hoje no telejornal!) alguém que sucumbirá certamente, agora não afogado no mar de águas calmas, mas provavelmente no mar da nossa indiferença...



Afinal, se olho para a vida, «Lampedusa» não é simplesmente o nome de uma ilha «lá longe na Itália»…Lampedusa é aqui tão perto! E as pessoas que morrem perto da minha/tua praia continuam a ser tantas, não achas? Talvez fosse bom começar a semana a transformar em interrogação a afirmação com que o Mestre nos interpela no final do Evangelho (Lucas 17,5-10) neste Domingo: 

 «Somos servos…e fiz(emos) o que devía(mos) fazer?»


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