Quem
não vê com o coração, andará sempre às escuras. É que para ‘ver bem’ não basta
ter os olhos abertos, é preciso mais! (cf. Salmo 27). Aprende a ver quem
aprendeu a escutar…e aprende a escutar quem se deixa interpelar, chamar pelo
nome. É sempre assim que o Mestre nos procura e nos encontra. Com nome e com
história, a nossa história de salvação. É que o Amor
nunca começa do zero, faz história e faz-se história, a partir daquilo que é o
nosso existir quotidiano (cf. Mt 4, 12-23). O Amor é sempre tecido com o passado que,
reconciliado, habita o presente e se abre ao futuro. É por isso que quem se
encontra com Cristo, mesmo se habitado por contradições ou fragilidades, não
permanece o mesmo.
Naquele dia, à beira-mar (porque
Deus gosta sempre de ‘horizontes largos’ e não de ‘medidas curtas’!) aqueles
homens, que eram Irmãos e estavam treinados na ‘escuta’ do mar da vida, não
hesitaram um segundo quando ouviram que “o Reino de Deus [é] está(r) próximo!”. Não hesitaram, pois a ‘memória
do seu coração’ sabia que aquela voz era desafio a definir-se diante da
realidade que sempre nos interpela. O Reino de Deus não é uma realidade
‘adiada’ para um futuro que há-de vir. O Reino é muito concreto! Podemos
tocá-lo e deixar-nos abraçar. Podemos sentir-lhe o ‘perfume’ e aprender a
celebrar a vida com cores novas. Podemos contemplá-lo e, ao mesmo tempo,
construi-lo. É que o Reino de Deus não é uma ‘estrutura’, nem o Seu reinado tem
as ‘nossas medidas’.
Habituados que estamos a regras e
a leis, custa-nos interiorizar esta ‘outra possibilidade’ para o nosso
‘modo-de-ser-e-de-viver’, dado que fomos mais educados para ‘temer’ do que para
‘ousar’. Jesus dá-nos coordenadas muito concretas para assumir o Reino como um
estilo de vida. Não é um código, não são exortações morais para nos tornarmos ‘bem-comportadinhos’,
trata-se de ‘sementes’ que cada um é chamado a plantar no coração da vida. E só
vive a ‘Paixão do Reino’ quem não tem medo de sujar as mãos para levantar quem
está caído, quem não tem medo de gastar a voz para denunciar os silêncios que
geram indignidade, quem não tem medo de se ajoelhar e de confiar(-se), quem não
tem medo de colocar de lado as redes que só ‘embaraçam’ para criar redes que unem
e geram laços novos, corações livres marcados pela ousadia da Páscoa e
dinamizados pelo sonho de uma Igreja que é a tenda do Ressuscitado montada no
coração da história.
Com aqueles 4 pe(s)cadores Jesus
começa ‘um jeito novo de ser Deus’ e de ‘ser de Deus’. Parte da periferia para
chegar ao centro. Escolhe corações inquietos para levar a paz. Para falar do Céu
escolhe homens com os pés na terra. E para oferecer a Eternidade, escolhe homens
habituados a navegar na noite. É que O Reino de Deus não nos pede que sejamos
perfeitos, pede-nos somente que estejamos disponíveis. Porque afinal, o Reino
não é para nos dar ‘certezas’…mas para nos oferecer a Vida!
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